Um estudo publicado em setembro deste ano na Science Advances mostra um aumento significativo na frequência e intensidade das enchentes do Rio Amazonas nos últimos 30 anos. Este trabalho, feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) em parceria com instituições e universidade do Chile, Peru, Inglaterra e França, utilizou 113 anos de registros diários dos níveis de água do Rio Amazonas feitos no Porto de Manaus.
O estudo mostra uma mudança no ciclo das cheias severas do rio entre a primeira e a segunda metade do século 20. Na região, as cheias são consideradas extremas quando ultraam o nível de 29 m, limite usado inclusive para a emissão de alertas em Manaus. Cheias extremas que ocorriam em ciclos de 20 anos agora ocorrem de 4 em 4 anos.
O aumento do número de enchentes está relacionado ao fortalecimento da circulação de Walker, que consiste em um sistema de células de circulação do ar zonais (leste-oeste) na região tropical do planeta. Essas circulações são forçadas por diferenças entre as temperaturas, e consequentemente pressão, dos oceanos tropicais. No caso do setor da América do Sul, as diferenças de temperaturas entre o Pacífico e Atlântico que controlam essa a circulação de Walker.
O ramo ascendente da célula de Walker aqui na América do Sul fica normalmente em cima da região amazônica, podendo se deslocar dependendo das condições oceânicas - por exemplo El-Niño. O que se observou durante o período de análise foi que a temperatura de superfície do Atlântico tropical aumentou consideravelmente, enquanto a do Pacífico tropical diminuiu. Essas mudanças proporcionaram uma intensificação no ramo ascendente da célula de Walker sobre a Amazônia, promovendo um aumento na chuva ao longo do século 20, e consequentemente, um aumento na frequência de inundações.
O aquecimento do Atlântico tropical ainda não é totalmente explicado, mas acredita-se que o aquecimento global é um dos fatores responsável. Além disso, uma das consequências das mudanças climáticas é o aumento da entrada de águas mais quentes do Índico na circulação oceânica do Atlântico Sul. O fluxo de águas do Índico para o Atlântico é conhecido como "Vazamento das Agulhas" tem aumentado ao longo do tempo devido ao deslocamento do cinturão de ventos de médias e atlas latitudes para Sul. As águas mais quentes do Índico são transportadas através das correntes oceânicas até a região do Atlântico tropical, o que justifica o aquecimento observado na região.
As mudanças no ciclo hidrológico da bacia Amazônica têm sido graves, com consequências para o bem-estar das populações no Brasil, Peru e outros países amazônicos. Dessa forma, estudos como o apresentado contribuem para um conhecimento atualizado para o aperfeiçoamento dos modelos de previsão de cheia da região Amazônica, importantíssimos para planejamento e elaboração de políticas públicas.